Vim a Jeju-Do, a maior ilha da Coréia do Sul,quase 100km ao sul do continente, para ver de perto o mundo extraordinário das haenyo,ou Mulheres do Mar.Com treinamento rigoroso e adaptação física, elas conseguem mergulhar até 20 metros de profundidade ,prendendo a respiração por até 4 minutos em águas frias que chegam a 10 graus de temperatura enquanto capturam abalones, ouriços -do-mar, e outras delícias marinhas.
...Chae Jung-za, mergulhadora de 47 anos, bate os pés-de-pato e mergulha suavemente até o fundo, 10 metros abaixo.Observando da superfície, vejo-a contornar pedras e espiar fendas, procurando o alimento com uma facilidade que nos faria pensar que respira água em vez de ar.
Com um ganchinho de ferro arranca uma lesma-do-mar.Por fim, depois de alguns minutos,Chae aponta o queixo para cima , bate os pés algumas vezes com rapidez e desliza até a superfície, os braços ao lado do corpo.Espero vê-la ofegante mas em vez disso ela solta uma série de assovios agudos e rítmicos.Todas as haenyo fazem este som.
É o canto de sereia das Mulheres do Mar, passado de mãe para filha.
O Dr. Warren Zapol, anestesista chefe do Hospital Geral de Massachusetts, em Boston,que as estudou na década de 90, diz que assoviar é mais do que uma tradição centenária.
"Ao soprarmos pelos lábios fechados, enchemos os saquinhos de ar do pulmão, que podem encolher com o mergulho",explica ele."É semelhante ao modo como as baleias e focas expiram quando mergulham".
..Como as focas antárticas, as Mulheres do Mar usam o baço como reservatório de oxigênio.Quando mergulham, o órgão se contrai,injetando na circulação glóbulos vermelhos ricos em oxigênio e permitindo-lhes ficar mais tempo debaixo da água.
As Mulheres do Mar começam o treinamento aos 7 anos e aprendem primeiro a colher algas perto da margem,e depois, a soltar os moluscos mais lucrativos em águas profundas, nos locais secretos das mães, sem se prenderem nas pedras.Também aprendem a ficar calmas diante de situações de perigo.
...No entanto, as Mulheres do Mar, tem cada vez menos oportunidades de se esforçarem até o limite:simplesmente já não há muito o que pescar.A poluição do oceano perto de Jeju-Do matou boa parte da vegetação submarina que alimenta os moluscos capturados pelas mulheres." Só restaram os ouriços-do-mar", diz Chae.
Para complementar a renda muitas delas plantam hortaliças ou trabalham em motéis e restaurantes a beira mar.
...Registros históricos indicam que, até o século 17, homens e mulheres mergulhavam no litoral da Ilha Jeju: os homens pegavam abalones nas águas mais profundas e as mulheres colhiam algas perto da margem.Quando o rei ordenou que colhessem abalones o ano todo, os homens fugiram da ilha,porque o serviço era muito perigoso.Isso deixou apenas as mulheres para se aventurarem mais longe do mar.Com o aumento da renda, veio um novo poder econômico, além da liberdade que elas não tinham no continente.
...formaram associações de mergulhadoras, que construíram escolas e estradas nas aldeias à beira mar.Seu poder de organização era tamanho que em 1932, as haenyo comandaram a resistência à colonização da ilha.
Em certo sentido, a prosperidade das Mulheres do Mar foi a sua ruína.Na década de 60 muitas tinham ganho o suficiente para comprar propriedades e educar os filhos que partiram em busca de oportunidades no continente.
...Em um de meus últimos mergulhos com as Mulheres do Mar, uso equipamento completo para poder sentar-me no fundo do oceano e observá-las trabalhando.Elas deslizam sem esforço para cima e para baixo, poesia em movimento,enquanto pescam.De repente o sol brilha através da superfície da água e sou inundada pela beleza daquele momento, a força real da sua sobrevivência.
"A gente arrisca a vida" ,disse-me Chae mais tarde, "mas ainda assim adoro mergulhar."
Texto retirado da revista Seleções Reader s Digest , maio de 2009.